A morte é mágica. Tem o condão de limpar tudo. Dizia-se nas
margens do Leça que o sabão lava tudo, só não lava as más línguas. Afinal, é a
morte. A morte é capaz de limpar o passado mais cretino de qualquer cidadão.
Temos nós o hábito do coitadinho na hora da morte. “Morreu, coitado”. Mas a
história não morre, pode é ser manipulada e, às vezes, apagada.
Parte do país lamentou a morte de José Hermano Saraiva, um
grande comunicador, ao que parece, mas um menos bom historiador, diz quem percebe
da poda.
O detalhe de estarmos a falar de um ministro da ditadura fascista de Salazar parece não incomodar quem o elogia. Lá está a morte a limpar as memórias. Diz-se que a educação era o seu grande amor. Um amor à moda antiga, daqueles que se resolvem à bastonada, como quando mandou a GNR carregar sobre os estudantes de Coimbra durante a Crise Académica.
Alguns desses, dos que foram corridos à bastonada por ordem do comunicador, elogiam-no mesmo assim, fazendo ressuscitar a triste máxima do “quanto mais me bates mais gosto de ti”. Outros, mesmo não tendo vivido esse dia, não perdoam a ditadura.
Continuo a achar que quem não foi bom em vida, não tem de
ser bom porque morre.
*publicado originalmente no Notícias de Matosinhos