segunda-feira, março 26, 2012

Tão bonitos que eles são

Quando o nosso império caiu - felizmente -, era de esperar que Portugal, a caganitazinha mais ocidental da Europa, perdesse aquela mania de considerar que Lisboa é Portugal e Portugal é Lisboa. Pois que não é. Assim como o norte não é o Porto e o Porto não é o norte.

Ao contrário do que seria normal, em Portugal, os provincianos da capital continuam a achar que o país são aqueles quilómetros quadrados de Lisboa-e-tudo-à-volta.

Vem isto a propósito de uma sondagem sobre homens bonitos. Segundo o site travelersdigest, os portugueses estão em 4.º na lista de homens mais bonitos do Mundo. A RTP, diligente na defesa da capital do império morto, enterrado e que só existe na cabeça de um ou outro ministro dos Negócios Estrangeiros, diz que são os lisboetas.

O texto não deixa dúvidas, refere-se a Lisboa, mas a uma das zonas mais frequentadas por turistas, entre eles, os que viajam desde a província até ao Bairro Alto. Eu, tripeiro, ainda lá estive há pouco tempo:

"Portuguese men tend to be worldly, well-educated and brimming with pride for their small but scenic country. In Lisbon, the often tall, charismatic and athletic gentlemen might surprise you with their firm grasp of not only their own culture but that of the other nations as well. All this said, tradition is still held in high regard for these divine manifestations of old-world values. They would surely appreciate an impromptu Fado performance at one of the many bars in the Barrio Alto, or a nostalgic stroll in the Alfama District – one of the most delightfully preserved sections of the city. Whatever you decide to do, these Latin seducers are guaranteed to sweep you off your feet."

Este saloiismo lisboeta fez-me lembrar o episódio do "senhor do adeus", ao que parece, uma pessoa famosa na capital mas desconhecida do resto do país. Ainda assim, quando faleceu, mereceu honras de notícia em todos os canais. Consta que era um idoso, parado no meio da rua, a acenar ao carros que passavam. Um extravagante, por estar em Lisboa; aqui, em Leça, ou mais para sul, no Porto, seria mais um maluco.

Em Leça tínhamos uma sem-abrigo a quem chamávamos Rosa Mota, por ser pequenina e andar devagarinho, e o Senhor dos Cães, outro sem-abrigo, que carregava um cão às costas e tinha à volta dele mais uma dezena de outros animais. Todos de quatro patas, que aos bípedes ele parecia fazer alguma confusão. Morreram os dois. Não eram de Lisboa. Não acenavam aos carros. Não foram notícia.

sexta-feira, março 23, 2012

Uma grande greve dos jornalistas



Estive nos piquetes da Greve Geral até perto das oito manhã. Entre a garagem da STCP da Via Norte, A Estação de S. Bento e a garagem de Francos da STCP.
Nesta última, a PSP procedeu à identificação de um motorista que se apresentava para trabalhar em substituição de outro, impedindo a saída do autocarro. Cumpriu-se a lei portanto.
Infelizmente, não estava lá qualquer jornalista para testemunhar o acto. Nem o agente que, em S. Bento, desabafava: "Estamos todos do mesmo lado. É a segunda vez que me calha vir para aqui e isto dói muito, porque nós também sofremos".


Não estava qualquer jornalista, como não esteve durante toda a noite em qualquer dos principais piquetes do Porto, pelo menos até às 8 da manhã. Daqui depreendemos que os jornalistas da Lusa, dos três canais que emitem notícias 24 horas por dia (RTPI, TVI24 e SICN), das rádios (pelo menos, Antena 1 e TSF) e dos jornais, incluindo aquele que se assume como a "voz do norte", aderiram em massa ao dia de greve. Recordemos que todos os jornais têm uma secção online e que, supostamente, dão notícias ao minuto. Ou dão Lusa ao minuto, mas isso é outra história.


É a única explicação lógica que encontro para a sua ausência e, por isso, felicito-os pela coragem, com toda a minha admiração, porque a precariedade é um dos grandes males que afecta aquele sector. Deram uma prova de união que não tem paralelo com qualquer das greves em que participei. Nas duas anteriores a estas estavam jornalistas. Nesta, desapareceram. 


E avançam que esta foi uma greve sem números porque, pelos vistos, mesmo no jornalismo de secretária custa muito dar um clique nos sites onde foram sendo publicados os números da adesão durante todo o dia.


Obviamente que não me passa pela cabeça que houvesse jornalistas a trabalhar e não tenham sido enviados para os locais onde estavam os mais significativos e numerosos grevistas.


Ficou do dia a imagem dos dois jornalistas agredidos, já durante o dia. Que tal não caia no esquecimento. Mas que tal não sirva para fazer esquecer que ontem houve uma grande Greve Geral, com milhões de trabalhadores a aderirem ao protesto, apesar de todas as pressões dos patrões e do Governo.


Que a indignação dos jornalistas não se fique só pelos seus camaradas agredidos em dia de Greve Geral, que se estenda a todos os outros que também sofreram agressões físicas e não só. Que se estenda a todos os dias do ano, na denúncia da violência que são o desemprego e a precariedade a que milhões de portugueses estão sujeitos, muitos deles seus camaradas de redacção. Olhai para o lado e eles lá estão.

segunda-feira, março 05, 2012

Guilherme, o Príncipe Momo*


Momo é um nome que atravessa os tempos, desde a Grécia Antiga, passando por Roma, até tempos mais recentes. Há dois séculos surge em Espanha e na América Latina, mais precisamente na Colômbia; no século XX, chega a Espanha, para ser adoptado pelo Brasil. Momo passou de deus mitológico a rei do Carnaval.

Na Colômbia, em Barranquilla, a personagem permanece até aos dias de hoje. É o rei da folia, que, nos três dias de festa, tinha como função permitir a desordem carnavalesca.
Nos dias que correm, o papel de Rei Momo cabe ao poder político, personificado em Miguel Relvas, que decretou que o Carnaval não seria feriado. O Rei Momo não cumpriu o seu papel mas, nestas coisas da democracia, o povo ordenou e brincou ao Carnaval tão a sério como já não se via desde os tempos de Cavaco, quando este ainda não se intimidava com manifestações de perigosos alunos da António Arroio.

Em Matosinhos, Guilherme Pinto, em jeito de Príncipe Momo, seguiu a voz do ministro alegando que o concelho não tem tradições de carnavalescas, não concedendo tolerância de ponto aos trabalhadores da autarquia. Ora, o presidente da Junta da Matosinhos fê-lo, cometendo, partindo do princípio que Guilherme Pinto tem razão, uma ilegalidade.
Formalismos à parte, que isto é coisa para ficar resolvida depois das eleições para a Concelhia do PS de Matosinhos, certo mesmo é que Príncipe Momo não deu folga aos funcionários autárquicos mas foi, ele próprio, ao desfile carnavalesco de S. Mamede de Infesta. Certamente em representação dos mesmos. 

* Publicado no jornal Notícias de Matosinhos